Apesar das técnicas de produção de aguardente já serem dominadas na colônia e da bebida já ser produzida em pequenas quantidades tanto em terras europeias como no Brasil, a produção de açúcar ainda era muito mais rentável. Assim como ficava mais barato trazer a bagaceira de Portugal. Os portugueses não queriam desperdiçar a cana destinada à produção do "Ouro branco" fazendo aguardente.
O processo de fermentação já era conhecido desde os antigos egípcios que produziam cerveja e vinho. O processo de destilação por sua vez já era dominado pelos alquimistas europeus desde as primeiras cruzadas (por volta de 750 A.C). O processo de destilação fracionada foi desenvolvido pelo farmacêutico e químico árabe Geber Abu Musi Jabir Ibn Hayan e serviu de base para que o persa Al Razi descobrisse o etanol que por sua vez deu origem à aguardente que em latin "acqua-ardens" significa água que pega fogo.
Com declínio da produção açucareira e com a concorrência das Antilhas, do Caribe e do Haiti, além do aperfeiçoamento da extração de açúcar de beterraba na Europa, a cachaça passou a ganhar importância econômica, principalmente no comércio escravagista onde era utilizada como moeda de troca para a compra de escravos.
Com o aumento da produção de aguardente as técnicas foram se desenvolvendo e a cachaça, cujo consumo era antes limitado aos escravos e trabalhadores braçais das fazendas começou a cair no gosto popular chegando à casa grande. Consumida em festas populares e banquetes, a bebida começou a ganhar fama, causando incômodo à coroa portuguesa pois concorria com a bagaceira e com os vinhos do reino.
Por volta de 1819 a cachaça já era o principal produto agrícola do país e contribuía significativamente com impostos que beneficiavam Portugal. Apesar disso, em 1847, uma carta régia proibiu a produção e o comércio da aguardente de cana de açúcar em todo o reino e suas colônias, vindo a culminar no episódio que ficou conhecido como a Revolta da Cachaça quando, em 1860, senhores de engenho do Rio de Janeiro uniram-se e marcharam contra o prédio da Câmara derrubando o então governador Salvador Correa de Sá e Benevides.
A revolta durou até 06 de abril de 1861 quando os revoltosos foram atacados por tropas imperiais vindas da Bahia e pelas tropas de Salvador Correa de Sá vindas do litoral sul. Apesar da derrota em 13 de setembro de 1861 a produção foi liberada por um novo decreto e este dia, desde 2010, passou a ser comemorado como o Dia Nacional da Cachaça.
Ganhando cada vez mais espaço na economia e principalmente na cultura brasileira a cachaça passa a participar ativamente de diversos acontecimentos importantes como a inconfidência mineira; a proclamação da independência em que D. Pedro em sinal de afirmação aos valores brasileiros ergueu um brinde com cachaça. Na semana de arte moderna de 1922 a cachaça era a bebida que regava os debates e as festas promovidas na casa de Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral e culminaria com Mario de Andrade escrevendo o texto intitulado "Os Eufemismos da Cachaça", no qual enaltece a bebida como símbolo da cultura e da afirmação nacional.
Entre outros momentos mais atuais podemos citar sua participação no ano França Brasil (2006) em que a cachaça teve um grande destaque, tendo a caipirinha se tornado "a" bebida do verão europeu. Mais recentemente o reconhecimento da cachaça pelo governo americano como bebida tipicamente brasileira, o que abre as portas dos EUA para a bebida que antes era exportada como "Braziliam Rum".
Agora que já contamos a história da cachaça no Brasil estamos prontos para discorrer sobre os vários tópicos que envolvem sua situação atual. Até nosso próximo post.
Paulo Godoy